Fungos, bichos que dão na gente

Estudos apontam que as doenças dermatológicas têm significativo impacto na qualidade de vida dos atingidos, sobretudo os cronicamente doentes (BINGEFORS et al., 2002), ressaltando a necessidade da sua valorização como problema de saúde pelos responsáveis pela formulação de políticas públicas, uma vez que são de fato valorizados pelos pacientes atingidos.

Os acometidos por doenças dermatológicas têm suas atividades diárias comprometidas, sendo limitantes ao ponto de provocar o absenteísmo em nível social, escolar e do trabalho, muitas vezes, gerando quadros de depressão (GUPTA; GUPTA, 2003).

O epitélio pode ser classificado conforme o número de camadas que possui: epitélio simples com uma camada apenas, epitélio estratificado com duas ou mais camadas. No caso da pele do couro cabeludo não é diferente, temos um epitélio pavimentoso estratificado que pode ser dividido em três camadas principais: epiderme, derme e tecido adiposo (GARTNER; HIATT, 2011).

A derme por baixo da epiderme é constituída por tecido conjuntivo denso, e apresenta vasos sanguíneos,
nervos, folículos pilosos, músculos eretores do pelo, glândulas sudoríparas e glândulas sebáceas. (GARTNER; HIATT, 2011).

Por serem estruturas originárias do mesmo folheto embrionário, a ectoderme, a pele, suas estruturas e mucosas se interconectam tanto para a saúde como para a patologia. Isso significa que todo o processo transformador pelo qual o alimento passa dentro do nosso organismo ao ser quebrado de macronutrientes em micronutrientes, se revela na beleza e saúde de nosso epitélio externo (CAMPBELL, 2004). O revestimento interno e externo é um órgão neuro-imuno-endócrino.

As dermatofitoses vêm sendo estudadas há muito tempo, como patógeno ciliar em franca proliferação, sendo comum ao homem. Características climáticas, práticas de higiene e consumo de gêneros alimentícios contribuem para a variação epidemiológica dos dermatófitos. (AQUINO et al., 2007

Os dermatófitos constituem um grupo de fungos que apresentam afinidade queratolítica (propriedade de quebrar a camada córnea da epiderme e reduzir sua espessura) e estão agrupados em três gêneros: Trichophyton, Microsporum e Epidermophyton. Podem acometer pele, pelos, cabelos e unhas de pessoas e animais, causando infecções, as chamadas dermatofitoses (TOMAZ, 2011). Cerca de 25 espécies de dermatófitos são identificadas como causadoras de infecção em humanos e animais (GRÄSER, 2008).

Fig 1: Imagem de microscopia polarizada de hifa septada fúngica encontrada em raspado de escamas de couro cabeludo infectado por dermatofitose.

A transmissão das dermatofitoses pode se dar de maneira direta, através de contato com pessoas ou animais infectados, ou indireta, mediante o contato com fômites contaminados (objetos pelos quais pode haver contaminação por alojar resíduos) (CHIMELLI, 2003). Como parte da diagnose, deve-se observar outras patologias como alopecia traumática, dermatite atópica, falsa tinha amiantácea, psoríase, impetigo, alopecia areata (GROVER, 2012).

Fig 2: Dermatoscopia de um couro cabeludo apresentado processo queratolítico que produz fômites, sugestivo de presença fúngica.

A terapia capilar vem utilizando-se de um instrumento há muito tempo no mercado, porém pouco usado, que é a luz de Wood, onde pode-se observar com facilidade os pontos que se referem à presença dos dermatófitos que habitam comumente o couro cabeludo. O sulfeto de selênio vem sendo usado para o controle das espécies habitantes do couro cabeludo, conforme preparação oficinal de uso tópico (xampu) descrita no Formulário Nacional da Farmacopéia Brasileira. Preconizado em diversos trabalhos, o uso do sulfeto de selênio em xampu a 2,5% (p/v) (BRASIL, 2011) pode estender-se além do período preconizado e ir além do tempo de adesão que o paciente suporta seguir. 12 semanas é o tempo que se pode usar o sulfeto.

Xampus são produtos utilizados para a limpeza ou fixação de substâncias nos fios de cabelo e/ou couro cabeludo para produzir um efeito curativo sobre a queixa do paciente. Nos casos dos xampus de tratamento, são acompanhados de um efeito farmacológico estimulante ou reequilibrante das funções fisiológicas do bulbo capilar e das glândulas sebáceas (DALLA LANA, 2017). O uso inadequado de xampus e/ou loções de forma desprogramada pode acarretar mais danos que benefícios e gerar a descontinuidade no tratamento. O manejo de protocolos para dermatofitoses realizados pelos pacientes em domicílio pode ser o motivo de muitas dermatofitoses não evoluírem para a cura. O xampu de sulfeto de selênio a 2,5% (p/v), por ser uma preparação oficinal vendida sem prescrição médica (BRASIL, 2011), é muito utilizado como cosmético usual domiciliar. Porém, por ser o sulfeto de selênio um degradante queratínico de efeito citostático (GLADWIN, 2010), este pode causar um ressecamento excessivo das hastes com consequente dano capilar.

Um cenário promissor no tratamento das dermatofitoses, que ofereceria maior perspectiva de sucesso, é se este pudesse ser conduzido e administrado por um profissional habilitado, capaz de acompanhar a involutiva do quadro através de diagnósticos recomendados pela literatura, como a lâmpada de Wood. Esta é uma luz ultravioleta de frequência entre 340nm e 440nm, capaz de fazer brilhar as capas quitinosas dos fungos por causa de sua crosta de aminoácidos, nos cabelos e pele infectados (BOLOGNA, 2013). Esta diagnose de acompanhamento é chamada de exame direto (GLADWIN, 2010).

Fig 3: Verde maça fluorescente e coral apresentado no exame direto com a luz de Wood, sinalizando presença fúngica de dois gêneros diferentes.

Vários autores, como (ZUZARTE, 2011), (MASSIHA, 2015) e (BAKKALI, 2008), descrevem que, além da terapia medicamentosa, há a possibilidade de tratamentos mais naturais com os óleos essenciais e vegetais. Contudo, estes também não descrevem a dinâmica e maneira de aplicação com que tais terapias deveriam ser executadas, deixando um vácuo na leitura de suas publicações.

Considerando que o uso inadequado leva à insatisfação do paciente com o produto e a insatisfação leva à descontinuidade, então entramos em uma roda-viva de tentativas e erros proporcionados pela linguagem inespecífica dos rótulos e pela falta de orientação próxima de um profissional habilitado para acompanhar (BRAGA, 2014).

Por ser a dermatofitose um problema a ser considerado pelas autoridades sanitárias como um problema epidemiológico, precisaríamos pensar em estratégias que: 1ª – solucionassem a dermatofitose em menor tempo de tratamento; 2ª – que os produtos ou a conduta não danificassem as hastes capilares ao ponto de fazer o paciente desistir do tratamento; e 3ª – poder excluir o uso de tratamento oral, já que o mesmo possui reações hepáticas adversas, podendo levar à resistência medicamentosa.

No caso do sulfeto de selênio usado dentro de um ambiente sem controle, destaca-se o risco aumentado de ocorrência de danos causados sobre as hastes e a expressão de um resultado medíocre do potencial cosmético da substância em questão.

AQUINO V. R; CONSTANTE C.C.; BAKOS L. An. Bras. Dermatol. vol.82 no.3 Rio de Janeiro May/June2007.
BAKKALI F.; et al. Biological effects of essential oils: a review. Food Chem Toxicol. 2008; 46: 446–475.
BRAGA D. Manual de Instruções em Terapia Capilar 1ªed; ed. Senac-DF 2014 ISBN-13 : 978-8562564451
BRASIL. Formulário Nacional da Farmacopéia Brasileira/ Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Brasília. Anvisa. 2011 256p.
BOLOGNA JL, et al. Dermatology, 2nd Edition. Elsevier. 2013. p. 1259-61.
DALLA L.; et al. Dermatofitoses: Agentes etiológicos, formas clínicas, terapêutica e novas perspectivas de tratamento. Clinical and Biomedical Research, [S.l.], v. 36, n. 4, jan. 2017. ISSN 2357-9730. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/hcpa/article/view/68880. Acesso em: 06 out. 2020.
GARTTNER LESLIE P.; HIATT, JAMES L. Histologia Essencial ed Elsevier 2011 Rio de Janeiro Tradução Cláudia Coana, et al.
GLADWIN MARK.; TRATTLER B. Microbiologia Clínica Ridiculamente Fácil. Edição: 4. Editora: Grupo A Selo: Artmed. 2010.
GRÄSER Y.; SCOTT J.; SUMMERBELL R. The New Species Concept in Dermatophytes—a Polyphasic Approach. Mycopathologia, v. 166, n. 5–6, p. 239–256,

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